terça-feira, 7 de junho de 2022

Review - Gnosia


Um simpático joguinho lançado para o PSVita em 2019, fiquei de olho em Gnosia desde que anunciaram sua chegada ao falecido e esquecido portátil da Sony. Felizmente, o jogo recebeu um port para Switch em 2020, bem como uma localização para inglês mais tarde, além de ter sido lançado na Steam em 2022. 

A proposta resumida é “um Among Us Visual Novel singleplayer”, claro que indo além disso, mas isso em si já é um chamativo. Definido como um Social Deduction RPG, inspirado no jogo de dedução "Lobisomem", ou "Mafia", você é um humano no meio de uma tripulação de uma nave viajando pelo espaço, e no meio disso há um Gnosia, um ser alienígena misterioso que "infecta" alguém do grupo e quer eliminar os outros.

O protagonista, que é apenas um avatar do jogador, entra em um debate com os outros tripulantes, tentando encontrar quem é o alienígena, o que é bem difícil inicialmente. Após o debate, alguém, que é votado por ser suspeito, é mandado para o sono criogênico, mais um ciclo se passa e vemos no próximo dia que uma pessoa foi assassinada, o que conclui que a ameaça ainda está a solta. Observando os comentários e padrões de cada personagem, procurando não ser acusado também, é a chave para encontrar a Gnosia.

Ganhando ou perdendo não importa, pois após os eventos iniciais, você se depara na mesma nave, agora com mais tripulantes e a ameaça continua, mas o culpado não é o mesmo. Sim, é mais um jogo de loop temporal, que têm sido um artifício narrativo bem popular em jogos de uns tempos pra cá, e Gnosia usa desse artifício de forma bem única, já que os eventos do jogo são curtos, basicamente os debates são linhas de diálogos repetidas aqui e ali, mudando os papeis e personagens devido a randomização.

Começando com uma equipe pequena, eventualmente mostrando todos 13 personagens disponíveis, além de criar novas possibilidades, como mais de uma Gnosia, entre a inserção de outros papéis. Uma característica dos impostores é a capacidade de mentir, enquanto é um jogo de debate, quem pode de fato mentir são os inimigos, que aí entram outros papéis antagônicos. Temos o "AC Follower", traduzindo para "Seguidor Anti Cósmico", que acredita que a Gnosia são seres corretos e ajudarão eles a suceder em sua missão e o Bug, uma falha universal que destrói aquele universo se ficar entre a tripulação vencedora, sendo que ele não pode ser assassinado, apenas congelado ou exterminado pelo scan do engenheiro. 

Engenheiro sendo um papel do "bem", ele pode verificar um personagem a cada dia e ver se ele é uma Gnosia. Também existe o Doutor, que pode diagnosticar se a pessoa votada para criogenia é uma Gnosia. Parte da graça desses papeis, é o fato de qualquer antagonista pode mentir sobre ser um deles, até fazendo um caso onde hajam mais de dois, o que acaba complicando e também sendo um facilitador para descobrir quem é um ser humano, eventualmente. O mais óbvio sendo o caso onde dois engenheiros, ou doutores, se apresentam durante um debate, nenhum é congelado na votação, mas no próximo dia, um é assassinado, obviamente que o vivo é suspeito.

Após encarar alguns “rounds” aleatórios, o jogador tem poder de escolher os parâmetros do próximo jogo, o que inclui a presença de quantas Gnosia e os outros papéis, podendo até escolher ser um dos vilões. Isso acaba se assemelhando bastante a jogos reais, onde você joga várias vezes e tenta arrumar formas diferentes de se divertir com outros jogadores. A diferença maior é que esse loop temporal é levado em conta e seu objetivo acaba sendo tentar descobrir o motivo por trás desse acontecimento, o que leva a conhecer mais desse universo e a tripulação.

Levei em torno de 20 horas para terminar Gnosia e em torno de 160 loops, onde os primeiros foram simplesmente só tentar vencer, o que não é exatamente a melhor coisa, visto que você tem atributos baixos e pode facilmente ser morto ou mandado para criogenia. O ideal é sempre usar o loop como oportunidade para aprender algo novo e buscar eventos, ainda mais pelo fato do jogo em si te ajudar a colocar parâmetros com acontecimentos novos. Acabando um jogo, mesmo perdendo, vai lhe garantir XP, presenciar um acontecimento único e conseguir mais informação garante mais XP, assim como ganhar em seu papel determinado.

O jogo tem bastante eventos únicos com alguns tripulantes, o fato de serem alguns talvez seja a maior crítica, todo mundo tem seu papel, só que alguns são mais importantes e outros recebem mais destaque, independente de sua importância para a narrativa total, geralmente sendo personagens mulheres, com ilustrações especiais e interações românticas. Algumas interações são únicas ao gênero do protagonista, porém não parece haver muito para se escolher como protagonista feminina

Ainda assim, é bem considerável o número de coisas pra se procurar, eu mesmo verifiquei e perdi algumas cenas únicas, fora duas habilidades para se usarem em debates. Não fui atrás até o momento, mas só de rejogar um pouquinho para pegar algumas screenshots, já dá vontade de jogar mais, principalmente ao tentar parâmetros mais difíceis, como 6 Gnosias, ou você sendo 1 gnosia e o resto da tripulação sendo humana e com todos os papeis vantajosos.

O elenco é certamente um dos pontos fortes, mesmo não dando um espaço e importância para todos, ainda sabe utilizá-los muito bem para contextualizar a narrativa principal e esse mundo futurista. Não gostaria de falar muito de suas características em si, pois é parte da diversão de descobrir como funciona cada um, porém vou entrar em algumas de suas peculiaridades. 

Temos personagens como Raqio, uma figura andrógina, declarado como não binário, com vestimentas azuis, pintura no rosto e um chapéu de plumas. Raqio tem língua afiada e costuma acusar e ofender os demais, o que a faz ser um alvo fácil para votação. Por outro lado, temos Yuriko, uma menina de olhos e cabelos negros, vestimentas brancas, parecendo algo meio religioso. Yuriko é assertiva e ameaçadora, mesmo não sendo uma pessoa que se manifeste tanto, é perigosa de debater, tanto quanto for aliada, quanto inimiga. É uma personagem intimidadora, com poucas expressões faciais e coberta de mistério.

Conhecer cada um deles vai permitir que você os entenda e entenda como poderá usá-los na hora da discussão, fora o fato de haver uma ficha para cada personagem, mostrando os fatos de cada um que você deve descobrir, além de seus “stats”. Sendo que cada um deles possuem atributos, assim como os seus, e cada loop vai ajudá-lo a ganhar mais experiência e aprender habilidades para serem usadas nos debates. Então, nos loops iniciais, a mencionada Yuriko, é uma adversária terrível se ela acusar você, visto que seus atributos são baixos, não há como convencer os outros tão bem, e nem passar despercebido. Assim como é difícil convencer os outros que Raqio não é um inimigo, nesse caso, até mesmo com seu personagem evoluído, acaba sendo um desafio manter essa personagem até o final de um loop.

O character design é bem único, com a arte feita por Kotori, um dos 4 desenvolvedores do estúdio Petit Depotto que criaram Gnosia. O traço é distinto, certamente chama a atenção, tendo aquele estilo anime junto de elementos únicos de cada personagem desse mundo futurista muito desenvolvido. A princípio, os personagens são humanos, mas possuem estilos diferentes de vestimentas que dão uma noção de que eles são de origens distintas pela galáxia.

Grande parte dos tripulantes possuem cores fortes e bem destacadas, que são parte da identidade de cada um. E o jogo é cheio desses pequenos detalhezinhos que te ajudam a jogá-lo com mais rapidez, como efeitos na tela e sons. Com o tempo, você não vai precisar ler todos os diálogos, só ficar pulando e vendo como os personagens estão discutindo em mais uma votação, entendendo o que já ocorre pelos efeitos, sons e palavras chaves em destaque, então esses auxiliares são muito úteis, fora recursos como um Log de discussão, histórico de votações e etc. 

Acredito que Gnosia possa, isso se já não virou, um pequeno clássico cult. Ele deve se encaixar no meio de jogos como Ace Attorney, Danganronpa e Zero Escape, onde é um adventure com elementos de Visual Novel, com a jogabilidade trazendo um atrativo maior do que uma VN normal, e aqui, a jogabilidade e narrativa são interligadas e funcionam perfeitamente com a proposta geral, apesar das limitações.

É aquele tipo de ideia que já interessante por si e parece ser simples, só que as mecânicas únicas e forma de interagir com os personagens misturadas com uma história bem interessante, criam uma experiência bem desenvolvida e um tanto complexa. Ainda mais vendo que é um jogo desenvolvido por 4 pessoas, o resultado de Gnosia é, no mínimo, absurdo, no melhor dos sentidos. 


Nenhum comentário:

Postar um comentário