The International 8

Sim, eu sei, acho que quase ninguém que acessa aqui se importa com Dota, mas me deixa falar um pouco do meu evento favorito do ano, o The International (TI). Ele é como se fosse a Copa do Mundo para o Dota (apesar de ser anual). É o resultado de um ano de competições convergindo para um único campeonato que bate records de maior premiação de e-sport ano após ano, chegando a 25,532,177 de dólares nessa que foi a sua oitava edição, dos quais os vencedores receberam $11,234,158.

Isso por si só já é bastante impressionante, porém o desenrolar da competição desse ano foi bastante diferente do que qualquer um poderia imaginar, com um time desacreditado superando todas as expectativas e quebrando "maldições" para levantar o Aegis of the Immortal e terem seus nomes escritos para sempre na listas de melhores do mundo.

   Antes de adentrar no mérito dos campeões, acho que vale uma nota rápida sobre a Pain Gaming, primeira equipe brasileira a participar do torneio. Apesar de terem sido desclassificados na fase de grupos, isso aconteceu por conta de apenas um dia em que o time pareceu não estar alinhado e jogou muito abaixo do que apresentou nos outros dias de jogo. Vencendo um total de 5 partidas mesmo contra grandes favoritos, a Pain Gaming demonstrou um jogo que entretém bastante o espectador e com certeza conseguiram muitos fãs.

    Quanto ao The International 8 em si, tivemos a oportunidade de ver jogos extremamente disputados em uma meta bastante variada, sendo que apenas 4 dos 115 heróis disponíveis passaram totalmente em branco. Surpreendentemente, a grande maioria dos jogos melhor de 3, resultaram em 2-0 e alguns times tidos como favoritos caíram antes do que todos imaginavam. Mas a maior surpresa com certeza veio da qualidade que os campeões jogaram.

   Posicionado em último no power rank do liquiddota.com, um dos maiores blogs do circuito de dota, OG tinha bastante o que provar. Na verdade nem acho que esse power rank estivesse tão errado na época que foi feito, pois o time havia acabado de sofrer um imenso baque. Apesar de terem tido 2 temporadas muito boas, o time nunca havia conseguido ir muito longe no International e, sendo que a temporada atual já não estava indo tão bem antes mesmo da competição principal, o capitão e fundador to time, "Fly" abandonou o barco junto com mais um jogador "s4" horas antes do embarque para o penúltimo torneio do ano, o último antes das qualificatórias para o International.

     A situação é ainda mais agravada emocionalmente dentro da própria equipe, uma vez que o, agora, ex-capitão e o outro fundador, "n0tail" são (ou eram) amigos muito próximos por mais de 10 anos. O que restou para OG foi tentar montar um time minimamente competitivo para tentar chegar ao evento principal participando desde as qualificatórias abertas (aquelas que qualquer grupo de amigos pode juntar um time e se inscrever).

   Assim, os três membros restantes (sendo que um deles já era aposentado e estava atuando de técnico, "Ceb") se juntaram com um ex-membro do time, "Ana", que estava sem jogar pouco ou nenhum torneio competitivo a um ano, e outro jogador quase desconhecido que nunca nem havia participado de competição nenhuma, "Topson", para tentar uma chance de se classificarem. Por isso que eu disse que o power rank citado acima não estava tão errado.

   E desse jeito a equipe voou para Vancouver para participar do que seria o torneio de suas vidas. Com um fase de grupos mediana, OG acabou conseguindo se classificar entre os 4 primeiros, garantindo a eles uma "vida extra", porém acabaram nunca precisando usar, derrotando os primeiros colocados do outro grupo, o time em que os dois "desertores de última hora" foram ao sair da OG e os chineses favoritos pra o título esse ano até chegarem na grande final.

   Falando assim, quase parece que foi fácil, mas e equipe foi vitoriosa de uma maneira quase inexplicável. No Dota as equipes costumam sempre seguir uma meta de jogo que é julgada como a melhor para o momento. Nesse momento, o jogo estava sempre sendo muito focado nos minutos iniciais da partida, sendo que quem obtivesse vantagem nessa etapa, provavelmente sairia vitorioso. Bem, em todos os 9 jogos que OG ganhou no evento principal eles estiveram atrás em algum momento da partida (geralmente esse momento sendo o começo) e um desses jogos eles ainda venceram enquanto estavam atrás no placar.

   Aí que entra a beleza do Dota competitivo, as mecânicas de comeback. Por mais que a meta estivesse dizendo para os times focarem na fase inicial da partida, o jogo tende sempre a beneficiar a equipe que está atrás se esta fizer alguma jogada que lhe dê vantagem, ou seja, se você está atrás, você recebe uma recompensa maior por matar inimigos. E foi isso que deixou este International tão bom de se assistir, pois OG soube se utilizar dessas mecânicas como nenhum outro time foi capaz, dando-lhes uma vantagem que ninguém antecipou. Como estou tentando não entrar em nada muito específico para deixar o texto mais simples, não vou entrar em detalhes das partidas, mas acreditem em mim quando digo que ao menos três partidas desse campeonato estão entre as mais memoráveis da história do Dota competitivo e isso é consenso entre a comunidade.

   Vocês devem ter achado estranho que eu comentei no começo sobre uma maldição, isso é uma espécie de piada dentro do International onde, até o momento, times ocidentais venciam em anos ímpares e times chineses venciam em ano par. Tudo estava caminhando para isso acontecer mais uma vez, já que os chineses favoritos usaram a vida extra para também chegar na grande final, sendo ainda considerado favoritos mesmo tendo perdido para OG uma vez.

   E, amigos, que grande final! Esta, diferente do resto do torneio, é disputada em uma partida melhor de cinco, porém a única vez que todas as cinco partidas foram utilizadas foi em 2013, que era tida, até então, como a melhor final dentre os Internationals. Verdade seja dita, isso ainda divide um pouco a comunidade, mas a final do TI8 conseguiu se elevar a um patamar não só para poder ser comparada, mas como muitos já consideram a melhor final de todas, incluindo eu. Não apenas por ter ido até o jogo 5, coisa que todo fã gosta de ver, mas pela maneira que o título foi conquistado, com os comebacks.

   OG venceu a primeira partida de maneira convincente, porém o outro time venceu de maneira ainda mais convincente os dois jogos seguintes. Então chegamos ao jogo 4 e, mesmo com OG bastante atrás do placar, não desistiram de lutar em nenhum momento, buscando uma desvantagem muito improvável de se ver em partidas desse nível e nessa meta. Se mantiveram vivos de maneira quase milagrosa para disputar o temível jogo 5.

   Aí entra outro fato quase inexplicável. No Dota, os times escolhem 5 heróis por partida para jogar e OG escolheu 5 heróis que, ao longo do torneio, tiveram pouco ou nenhum sucesso (sim, um dos heróis selecionados tinha 0% de vitórias na competição(Magnus)). Todos olharam para isso e pensaram "OG perdeu". Todos olharam para o jogo com 15 minutos com uma vantagem grande para os chineses pensando "já era para OG". Todos, menos os jogadores da OG. Mais uma vez contra todas as expectativas, eles conseguiram. Vencendo batalha após batalha sem errar nenhuma vez e acertando todos os combos necessários de maneira perfeita, conseguiram finalmente o tão sonhado título, quebrando a maldição.

   Links para os melhores momentos da final:
   - Parte 1
   - Parte 2

   Se você chegou até aqui nesse meu texto sobre um assunto que você possivelmente não tem nem um pouco interesse, muito obrigado. Sim, no fim é só um jogo, mas as histórias por trás dessa competição e a maneira como um time quebrado e desacreditado conseguiu superar tantas dificuldades para se sagrar campeão é uma coisa que eu queria compartilhar. 

   Desse jeito, um aposentado, um cara que participava de sua primeira competição, um outro que ficou um ano praticamente parado, um amigo desiludido e um quinto que, por mais que não tenha uma característica "quebrada" que nem a dos outros, é provavelmente um dos melhores jogadores que eu já vi jogar em sua posição realizaram um sonho. Além, é claro, de um pouco mais de 2 milhões de dólares a mais em cada conta.