segunda-feira, 13 de julho de 2020

A cultura do hype

   Há algum tempo estamos vivendo em um mundo onde o entretenimento é alimentado por empolgação. A dita mídia especializada lança artigos sobre qualquer suposto rumor como se fosse a próxima grande coisa e o seu público entra na onda. Isso faz com que essas pessoas empolgadas "espalhem a palavra" e empolguem outras pessoas, criando uma corrente de esperanças vazias que só podem ser saciadas se o objeto de sua imaginação for efetivamente e completamente trazido a vida.



   Esse tipo de prática vem sendo até incentivada, com inúmeros vídeos de youtube com reaction de imagens de má qualidade vazadas, listas de situações imaginárias que podem estar por vir ou anúncios de datas para revelação de teasers. Nós estamos cercados digitalmente por sites, perfis e canais de entretenimento que ganham a vida com esse tipo de coisa pois sabem que o público consome. E consomem porque a empolgação é um sentimento, digamos, empolgante.

   Essas fontes de "notícia" sobre entretenimento usam clickbaits baratos querendo apenas acessar o sentimento de hype para ganhar visualizações. E, quando não ganham o clique, muitas vezes o seguidor apenas lê o título e compartilha achando já saber de toda a história baseado em duas linhas que exageram o fato ou contam meias verdades. Isso é em parte culpa nossa, por termos preguiça de ler um texto ou assistir um vídeo longo e tirar as próprias conclusões. As vezes queremos apenas a conclusão já pronta, mas isso não pode se tornar o padrão.


   Veja bem, não estou criticando a empolgação ou o direito de alguém ficar empolgado, muito menos dizendo que eu nunca estive envolvido a esse ponto em algo. Isso é parte natural da vida, só não podemos deixar que esse sentimento dite nossas emoções. Vivemos em um mundo plural e devemos aceitar que muitas coisas simplesmente não são feitas para nós, ainda que tenha um grande público que se atraia por tal material. 

   É aí que entra o efeito colateral do hype, a desilusão quando o objeto há muito almejado nasce diferente e, aos seus olhos, deformado. Quando não completamente quebrado e errado. Como exemplo podemos tomar o anúncio de Pokémon Unite, o Pokemoba. 

   A Gamefreak fez um "direct" com alguns outros anúncios e a promessa de um outro game a ser mostrado na semana seguinte. Nesse ínterim, uma quantidade enorme teorias sobre o que viria a ser mostrado inundou as redes, mas ninguém previu o moba em parceria com a Tencent. A reação geral foi de irritação, não por não terem gostado do que foi mostrado, mas porque todas as fichas de sua esperança estavam em outro lugar. Isso combinado com um estilo de jogo que não é do agrado de uma pessoa leva ela a ficar irritada.


   Devemos ter a ciência de que tudo que é criado no mundo do entretenimento é feito por empresas privadas que conhecem o seu público geral muito melhor do que nós individualmente, sendo um único fã. Ou ao menos deveriam. Então é claro que alguns produtos da marca simplesmente não vão fazer tanto sentido para uma ou outra pessoa. Por que isso deveria levar alguém à irritação?

   Outro exemplo, mais recente ainda, foi a treehouse da Nintendo para demonstrar um pouco do Paper Mario: The Origami King e um anúncio de novo jogo da Wayforward. A empolgação de um anúncio de um anúncio foi tanta que as teorias surgiram em velocidade enorme como resposta ao tweet. Isso inclusive levou a própria Nintendo a adicionar um adendo falando que o game não tinha nada a ver com uma IP dela para tentar reduzir a expectativa do público. Aconteceu de novo, irritação por desilusão. 

   Eu ainda poderia citar o ciclo de lançamento de The Last of Us 2, a sequência de um game muito amado que foi do céu ao inferno para algumas pessoas por questões de escolhas narrativas reveladas em um vazamento. Eu acredito que a questão aqui é muito mais intolerância do que qualquer outra coisa, apesar de que ainda está relacionada à desilusão por conta de uma empolgação gerada na cultura do hype. O problema aqui é que a desilusão é baseada em algo ultrapassado e desrespeitoso.


   Somos quase reféns dessa indústria que se aproveita das mentes facilmente maleáveis que o ser humano tem para lucrar com um conteúdo raso, idiotizando fidelizando o seu público para que consumam ainda mais de seu material e continuem o ciclo. Eu quero crer que eventualmente vamos nos cansar de cair no buraco da desilusão e aos poucos formaremos um pensamento crítico, cansados de ver outros criarem uma falsa empolgação por nós.

   Para terminar, a Devolver vem fazendo há alguns anos em suas apresentações críticas à como a indústria dos vídeo games trata seus fãs. Esse ano foi abordada a questão que eu tentei aprofundar neste texto. Se eu não fui efetivo no que tentei discutir, talvez os dois trechos expostos no vídeo abaixo façam um trabalho melhor do que eu.


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