Assim como o Resident Evil 7, Resident Evil 8 "esconde" seu número em meio ao título, se chamando de Village. Quem acompanha desde a década de 90 viu a série se transformando, indo para as mais estranhas direções e até a brusca mudança de Resident Evil 4 acabou sendo um ponto divisivo, só que não deixou de ser um marco para a franquia e videogames em geral. Resident Evil 7 chegou com uma cara mais modernosa de jogos de terror, mas puxando diversos aspectos da origem da série. Village continua com a base do anterior, sendo em primeira pessoa, com um estilo mais grotesco e cinematográfico de terror, puxando algo do passado ao se inspirar no já mencionado Resident Evil 4, porém sem ir total "ação".
Ethan Winters mais uma vez é jogado numa situação infernal. Dessa vez num vilarejo na Europa, onde foi levado após sequestrarem sua filha e matarem sua esposa e isso foi feito por ninguém mais ninguém menos que CHRIS REDFIELD. Sim, aquele cara que tá aí desde o primeiro jogo e é conhecido por socar pedras gigantes. O dito vilarejo é um lugar sinistro que a maioria das pessoas sumiu e há sinais de conflito em todo lugar. A comunidade é liderada por Mãe Miranda, uma líder religiosa que parecia proteger o lugar até acontecimentos recentes mudarem tudo. Ela não domina o lugar sozinha, Miranda está acompanhada de quatro "lordes" que comandam certas áreas da vila. Ethan conhece as figuras peculiares que o querem morto, o que leva o nosso protagonista a explorar esse lugar macabro e enfrentar os mais diversos monstros que o habitam, com esperança de encontrar sua filha, Rose.
O começo de Village é um pouco nos trilhos demais apesar de ser legal explorar a casa de Ethan e verificar como está a situação após o acidente de Louisiana, o nascimento de Rose e a mudança do protagonista e sua esposa Mia para a Europa. Quando você acorda num local escuro no meio da neve após um acidente, até encontrar a vila e alguns monstros, são praticamente cutscenes jogáveis e alguns momentos de gameplay um pouco scriptado. Até fiquei um pouco empacado jogando o primeiro grande confronto, onde os licanos atacam em grande grupo, pois acreditava que devia matar todos os inimigos, quando na verdade a solução era sobreviver até uma cutscene ocorrer e todos os lobisomens irem embora. Clara referência ao início de Resident Evil 4, infelizmente sem nenhuma piada com bingo.
Não que o jogo não deixe de ter seu lado galhofa, com momentos absurdos e Ethan mais falastrão que nunca e geralmente tem alguma frase debochando algum dos chefes, ou demonstra alguma angústia e raiva em relação a sua jornada tortuosa em busca de Rose. É uma premissa bem básica, mas funciona bem e não tem como não simpatizar com o rapaz, que não é a única vítima dessa situação toda. Os clássicos arquivos e diários dos cidadãos da vila dão uma ideia de como esse lugar foi dominado e seu povo sofreu na mão de Mãe Miranda. É basicamente uma mistura dos experimentos "Umbrellisticos" com uma ciência alá "Frankenstein" e mais algum misticismo bizarro, dando vida as mais diversas aberrações e histórias trágicas. Eventualmente tudo acaba indo pro lado de BOW, militares e os papos de sempre de Resident Evil.
O vilarejo é um mapa bem grande e acaba sendo a parte central que leva as outras áreas e chefes do culto. Seguindo algo parecido com as casas e a família Baker de RE7, os lordes e seus domínios oferecem experiências diferentes, como um castelo com puzzles, portas trancadas e um "perseguidor" na sua cola, seguindo os moldes mais clássicos de Resident Evil. Aí do nada você encontra um pântano onde a maioria das casas estão por água abaixo e seu desafio e achar um jeito de andar por ali enquanto um monstro aquático tenta te devorar. Não querendo spoilar mais, pois Village proporciona experiências bem únicas, me encontrei surpreso diversas vezes e todas de forma positiva.
Há bastante incentivo para explorar tudo, você encontra bilhetes com pistas de onde há mais coisas interessantes ou itens que dão acesso a algo que você viu há tempos no jogo e provavelmente não deve lembrar exatamente. Por sorte, o mapa marca praticamente tudo com que você interage, ficando bem fácil de localizar as coisas, e ainda tem aquele sistema de cores que indicam se uma sala que você está já teve todos itens coletados. Tentei fazer praticamente tudo de "side-content" e sempre estive bem equipado e com dinheiro para comprar o necessário, só não consegui peixe o suficiente para fazer alguns alimentos que aumentam alguns atributos do Ethan. Isso é feito graças ao misterioso mercador, o meninão gigante Duque, que também fornece outros recursos importantes para a sua sobrevivência.
Não há muito que se preocupar em questão de gerenciamento de inventário, apesar do sistema da maleta estar de volta, onde você tem que fazer um "Tetris" com seu equipamento para ficar todo certinho no inventário. Não teve uma vez que precisei organizar a maleta ou deixar de pegar algo devido a falta de espaço, acho que principalmente pelo fato dos materiais para crafting não ocuparem espaço, sendo que os itens criados por eles ocupam. Talvez tenha sido sorte minha de sempre aumentar o tamanho do inventário nas horas certas. Apesar do sistema da maleta me agradar, não há muita razão pra mexer nele.
O outro problema é a parte das armas, que poderiam, assim como RE4, serem um incentivo para rejogar tentando um arsenal diferente, mas toda nova pistola e escopeta são melhores que as antigas, apesar de haverem três de cada. O problema é que parece que você acaba investindo muito nos upgrades delas e chegam armas melhores depois. O que eu recomendaria é apenas fazer upgrade de dano nas duas primeiras pistolas e escopeta, e eventualmente fazer aquele velho truque de upar a capacidade de munição quando a arma está sem balas, o que lhe garante a arma totalmente carregada. Enfim, pode até ser um incentivo para os jogadores tentarem terminar o jogo usando armas mais fracas, apesar de ainda preferir ter um arsenal mais forte.
Dito isso, todo sistema de combate é excelente, manusear cada arma tem aquela sensação satisfatória pra sair metendo a bala em qualquer bicho que apareça por aí. A defesa continua sendo um recurso essencial para sobreviver a ataques e agora Ethan pode empurrar o inimigo após se defender. Isso complementado com elementos do cenário que podem ser usados para lhe auxiliar, como sacos de farinha que podem serem utilizados para criar uma nuvem que atordoa inimigos, ou armários que podem obstruir uma porta lhe dando oportunidade para vasculhar a casa, recarregar suas armas e preparar armadilhas. E é claro que as lutas com chefes também são excelentes, colocando alguns momentos únicos onde Ethan enfrenta uma forma monstruosa de algum dos lordes, as lutas são bem diretas e sem muitas gimmicks, fora serem um espetáculo visual.
Sinto que os desenvolvedores aprenderam muito com alguns erros de RE7, repetiram algumas coisas da fórmula, mas fizeram algo bem diferente com Resident Evil Village. É visível a paixão da equipe pela própria franquia, bem como outras diversas fontes de horror. Dá para perceber alguns elementos de Silent Hill, Clock Tower e Evil Within. Resident Evil foi uma fonte inspiradora de muitas franquias e é divertido ver ele aprendendo com outros jogos e fazendo do seu jeito.
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